sexta-feira, 5 de julho de 2013

30 anos da Rede Manchete

Há cerca de três semanas, recebi esta preciosidade gentilmente cedida pelo amigo carioca Cláudio Roberto, que teve o privilégio de estar presente na noite de lançamento deste maravilhoso documentário em comemoração pelos 30 anos da Rede Manchete de televisão, caso ela ainda estivesse no ar.

A data comemorativa deu-se em 05/06/2013, e alguns estudantes de jornalismo (e fãs órfãos) da UFRJ assumiram a empreitada de fazer um trabalho incomensurável como este, e contar em cerca de uma hora e vinte minutos de produção, boa parte de tudo aquilo que significou a TV idealizada e presidida pelo grande ícone chamado Sr. Adolpho Bloch.

Não há muito o que adentrar no material, pois logo isso vai ser disseminado pela internet afora, e todos os simpatizantes terão acesso. Então, não é meu intuito descrever com palavras tudo aquilo que foi apresentado. Mas, pelo menos pra mim, a Manchete foi algo mais. E por este motivo, sinto-me na obrigação de tecer alguns comentários, pois, além de marcar época para uma geração inteira, a rede, por intermédio de sua programação, em muitos aspectos, norteou minha vida.


É fato que foi uma empresa privada, e como tal, o mínimo que precisava ser feito era gerar lucro. E, para tal fim, o caminho foi tortuoso, ora com altos índices de audiência e programação equiparada à gigantesca e inatingível Rede Globo, ora amargando reprises de novelas e poucos capítulos de desenhos ou séries, sem esquecer da venda de horários para Igrejas ou produções independentes, como as incansáveis ofertas do Grupo Imagem. Também não é novidade que o conglomerado acabou da pior forma possível, deixando dívidas milionárias contra o governo e ex-funcionários e colaboradores. Mas a mim cabe apenas citar aquilo que vivi diretamente, por intermédio da tela da TV.

Quando a emissora estreou, eu tinha apenas dois anos. Então, não acompanhei tudo, mas comecei justamente no final de 1987/ começo de 1988, quando as séries Jaspion e Changeman causaram um estrondo inigualável, tendo suas aventuras espalhadas por todo o país com sinal emitido diretamente da Rua do Rússel. O meu fascínio foi tão grande que até abandonei os desenhos He-Man e Thundercats, que tanto adorava da Globo para migrar para a concorrente. Isso também teve o seu lado negativo, pois acabei perdendo muitas coisas legais em outros canais, como por exemplo a exibição do clássico Zillion.


Flashman, Jiraiya e Jiban foram as sucessoras, que agradaram de forma ímpar e a altura das antecessoras. Assim foi até 1991, quando as novas séries (e últimas deste período) estrearam: Cybercop, Maskman, Spielvan e Black Kamen Rider. Em 1992, confesso que dei uma enjoada, e abandonei esse nicho. Não lembro o que via na tv nesse hiato, mas, em 1994, o novo "Jiban" (Winspector) acendeu novamente a chama do fã de tokusatsu que chegou quase a se apagar. E, já em seguida, Os Cavaleiros do Zodíaco. Aí a Manchete me "comprou" novamente. Desta vez de "papel passado". E assim foi até o fim, o último dia, eu lá, torcendo para que aquele símbolo clássico da letra M, "de lado" na tela da TV, com um relógio no canto inferior direito não desaparecesse. Mas desapareceu. E com ele, uma época saudosa e inalcançável da minha vida.

Também em 1990, quando eu tinha apenas nove anos, meus pais renderam-se ao fenômeno Pantanal. Lembro de muitas vezes ter ficado até mais tarde na sala, acompanhando aquelas imagens lindas do estado do Mato Grosso. E no ano seguinte, a reprise direta de A História de Ana Raio e Zé Trovão, por volta das 18:00 hs eu assisti na íntegra. Saia voando da escola (o sinal batia às 17:50) e corria feito doido pra não perder sequer a abertura. A título de curiosidade, a tal escola ficava há sete quarteirões de minha casa.

Mas, perto do fim, eu tive uma outra felicidade indescritível. Foi ao ver esta chamada:



Há anos eu procurava de todas as formas possíveis um jeito de rever (ou ter) a série do Jiraiya completa. Lembrava-me dos tempos áureos, onde esta série estava alocada num lugar muito bom dentro da minha memória, mas não havia nada. Alugava sempre as mesmas três fitas que tinha na locadora daqui: A Emboscada (minha preferida), As Sete Sombras e a Espada de Shinguen. Peguei o telefone da Santa Alice - a representante da distribuidora Top Tape na capital paulista -  que havia no encarte da VHS, mas a empresa já não existia mais. Um amigo da família passou em frente ao endereço que constava no mesmo encarte, e nada. Nenhuma pista. Mas algo dentro de mim dizia pra eu não perder as esperanças. Então, quando vi aquele comercial, a emoção tomou conta.


É claro que houveram inúmeros fatores que prejudicaram e fizeram com que o sonho não terminasse da melhor forma possível, mas não tenho do que reclamar, apenas do que arrepender: de não ter gravado em SP. Os 10 primeiros capítulos foram repetidos a exaustão, e quando soltavam novos, cerca de mais uns 10, tome-lhe reprise de novo. Até que chegaram ao cúmulo de passar um lote, e, quando ia ao ar o último do lote, como por exemplo o 34, no dia seguinte passavam o 35, e voltava desde o primeiro. Isto era uma agressão ao telespectador, digno de fazer um B.O. Na época foi sofrido, mas hoje deixa saudades. E foi uma pena maior ainda terem exibidos apenas 38 episódios de um total de 50. Porém, mais adiante, com a propagação da internet, pude ter em DVD essa série completa.


Outra felicidade difícil de explicar com palavras foi ver em 2009 o SBT reprisar o Pantanal. E alguns anos depois, a Ana Raio e Zé Trovão. Acompanhei todas de cabo a rabo. Este foi o último contato direto que tive com produções do passado da Rede Manchete.


Um pouco antes do lançamento do documentário, eu havia acabado de ler o livro do Elmo Francfort, que foi disponibilizado gratuitamente pela Imprensa Oficial neste link. Outro trabalho de mestre que, de mãos dadas à produção audiovisual, narram um percentual considerável da história da TV Manchete do ponto de vista de quem por lá passou. "Causos", curiosidades, detalhes técnicos, datas, tudo muito bem pesquisado e escrito.


E, pra fechar com chave de ouro minha singela homenagem à menina dos olhos do Sr. Adolpho, há alguns dias foi publicado no facebook um link contendo um folder de apresentação, pela empresa que está terminando a restauração e repaginação do edifício sede das empresas BLOCH. Clique aqui para acessar. Pouparam grande parte da idéia original do Sr. Oscar Niemeyer - não havia motivos de não o fazerem - e isso me deixa muito feliz ao saber que pelo menos o local onde esta fábrica de sonhos denominada Rede Manchete foi gerada, está sendo conservado e preservado para o futuro. A história é algo muito importante. O que acontece no presente é reflexo total dos fatos do passado. Talvez amanhã esteja funcionando ali uma empresa que nada tem a ver com o que aquela construção abrigou desde sua inauguração, mas em contra partida não vai ser demolida ou ficar abandonada, acabando-se aos poucos.


E, neste último parágrafo, não posso deixar de citar as inúmeras incertezas e mistérios que rondam o acervo da extinta emissora. Chegam até mim os mais diversos tipos de informações, de forma aleatória e teórica, porém, a certeza absoluta nunca vêm. O Acervo foi leiloado, e quem arrematou os móveis doou as fitas para a TV Cultura, conforme esta matéria? Este acervo está realmente lá e catalogado? O Governo, inicialmente não tinha interesse em ajudar a resolver o imbróglio sobre os direitos autorais, e de uma hora pra outra, resolveu se mexer, e tudo foi (ou será) encaminhado para a Cinemateca digitalizar? Mas a Cinemateca não estava passando por dificuldades? Então, como existem materiais oficiais da emissora sendo vendidos no Mercado Livre? E os materiais de terceiros que não puderam ser retirados da emissora nos últimos anos por conta de uma ordem judicial? Será feita digitalização desse material também? Mistérios e mais mistérios, coisa muito comum neste país. Embora muita coisa eu já tenha pesquisado, só me resta, assim como a outros milhares de fãs, torcer. E esta é uma posição que particularmente não me agrada.

2 comentários:

Marco Antônio disse...

Excelente postagem Ivan !
Se a Rede Manchete tivesse sobrevivido, talvez hoje a Globo produzisse melhores programas, porque a Manchete balançou a Globo nos anos 80, assim como a Tupi balançou nos anos 70, principalmente no tocante às novelas.
Infelizmente, fechou mais uma emissora, que faz muita falta com toda a sua programação !

Betarelli, Ivan D. disse...

Olá Marco, grato pelo comentário.

Realmente a Manchete não merecia ter tido o fim que teve. Tudo culpa de administração incompetente, já que não analisaram o "retorno" a longo prazo dos altos investimentos em coisas não tão certas que estavam fazendo. Nem que não fosse a Manchete que incomodou a Globo em determinada época, e fosse uma emissora mais recatada, com uma programação modesta, sem muitos "estouros", mas ainda deveria estar no ar. Só que muitos fatos escusos estão ligados ao fim do império... os textos sem sempre são claros, alguns nomes são citados, e é fato que ninguém quer ter ligação nenhuma com o espólio que ficou. Coisas do nosso país!